Cientistas da Bolívia e dos Estados Unidos relataram, nesta semana, evidências da transmissão entre humanos do raro vírus Chapare, em 2019, em La Paz, na Bolívia. A virose causa febre hemorrágica, que pode ser mortal e tem sintomas parecidos os do ebola e da dengue.

Por enquanto, os pesquisadores não têm muitas informações sobre o vírus. A boa notícia é que ele não é tão transmissível quanto o novo coronavírus, que causa a covid-19. Até o momento, não há relatos dele fora da Bolívia.

Em entrevista ao jornal The Guardian, a epidemiologista Caitlin Cossaboom, do Centro de Controle de Doenças dos Estados Unidos, afirmou que três pessoas já morreram por causa deste vírus.

“Nossa pesquisa confirmou que um jovem residente médico, um médico da ambulância e um gastroenterologista contraíram o vírus após terem contato com pacientes infectados. Agora, acreditamos que muitos fluidos corporais podem potencialmente carregar o vírus.”

Vírus está presente em roedores

O vírus Chapare é um arenavirus do Novo Mundo, um grupo de vírus causadores de febre hemorrágica, doença que pode ser mortal e incluem sintomas como febre, fortes dores no corpo, vômito, feridas na pele e sinais múltiplos de hemorragia.

Assim como o novo coronavírus, também é um vírus zoonótico, ou seja, está presente em animais —no caso, em roedores.

Os arenavirus sul-americanos são conhecidos desde os anos 1950 —inclusive no Brasil—, mas a sua transmissão para humanos é considerada muito rara. A pessoa precisa ter contato com fezes e urina do animal contaminado.

Segundo o Ministério da Saúde da Bolívia, a febre hemorrágica causada pelo vírus não possui tratamento. É possível fazer apenas o suporte com medidas gerais que permitem que o corpo de uma pessoa derrote o vírus. “Não existem antivirais específicos para esse tipo de doença, é claro que, em termos de opções terapêuticas, se aproveita tudo o que a humanidade tem em mãos”, declarou, em 2019, a ex-ministra da Saúde, Gabriela Montaño.

Os arenavirus sempre existiram, por milhões de anos, em seus hospedeiros originais, mas passaram a infectar humanos após mudanças ambientais provocadas agricultura e crescimento das cidades, o que gerou uma explosão na população de ratos.

Chapare já tinha sido documentado

O novo vírus da Bolívia foi documentado pela primeira vez em 2008. Pesquisadores da Bolívia e dos Estados Unidos analisaram um pequeno foco de febre hemorrágica ocorrida em um vilarejo na província de Chapare, no norte da Bolívia, entre dezembro de 2003 e janeiro de 2004.

Poucas pessoas foram infectadas e apenas uma morreu. Análises genéticas levaram à conclusão de que se tratava de um novo arenavirus, que recebeu o nome de vírus Chapare (Chapare mammarenavirus). Seu hospedeiro natural são roedores nativos da região e, até então, acreditava-se que a transmissão entre humanos era impossível.

Essa percepção começou a mudar no meio do ano passado, quando, 15 anos depois, o vírus voltou a aparecer. Mas, desta vez, a 800 quilômetros de distância de Chapare, na capital La Paz. Cinco pessoas foram infectadas, e três delas morreram.

Como três profissionais de saúde que tiveram contato com os pacientes ficaram doentes —e dois deles morrem—, os cientistas desconfiaram que a transmissão poderia se dar por meio de fluídos de pessoas contaminadas. O que foi confirmado agora por pesquisadores do Centro de Centro de Prevenção e Controle de Doenças (CDC) dos Estados Unidos e do Centro Nacional de Doenças Tropicais da Bolívia. Eles apresentaram essa conclusão em uma reunião da Sociedade Americana de Medicina e Higiene Tropical, na segunda-feira (16).

Pesquisadores alertam para falso diagnóstico

Os pesquisadores fazem um alerta que o vírus Chapare pode ter circulado incógnito entre pessoas nos últimos anos: os doentes podem ter recebido falso diagnóstico de dengue, já que as doenças têm sintomas parecidos e a dengue é endêmica na Bolívia.

“Embora ainda há muito que permanece desconhecido sobre o vírus Chapare, é louvável a rapidez com que a equipe de pesquisadores foi capaz de desenvolver um teste diagnóstico, confirmar a transmissão entre humanos e descobrir evidências preliminares do vírus em roedores”, disse o presidente da Sociedade Americana de Higiene e Medicina Tropical, Joel Breman, em entrevista para o The Guardian.

Em tempos de pandemia, a boa notícia é que a transmissão entre pessoas do novo arenavirus é muito mais difícil do que a do novo coronavírus. Este último causa uma virose respiratória, por isso, pode ser transmitido pelo ar.

Pelo que se sabe até agora do vírus Chapare, a infecção ocorre se a pessoa tiver contato com fluídos, como vômito, sangue, urina e fezes do doente. O que é mais fácil de controlar, como foi o caso da epidemia do vírus de ebola, na África, em 2014.

fonte: UOL